A AMA saúda o Dia Mundial do Ambiente como meio de continuar o combate pela consciencialização da importância de se preservar a natureza e o nosso planeta.
Hoje com a decisão do Trump em negar a evidência do aquecimento global e as consequências que todos já sentimos nas alterações climáticas, a que se juntam ganâncias locais de negócios para lucros fáceis e rápidos através da destruição do ambiente, a interrogação do texto abaixo "Para que queremos o ambiente" faz todo o sentido.
Maria Amélia Martins-Loução
Para que
queremos o Ambiente?
A sociedade terá de ser cada vez mais
responsável e apta a defender os interesses de um meio natural que é de todos e
para todos.
5 de Junho de 2017
Hoje é o Dia Mundial do Ambiente. Desde
há muito se fala de ambiente, mas qual o seu significado para a grande maioria
das pessoas? Ambiente, do latim ambiens (que anda em volta de), é entendido
como o conjunto de coisas que nos cercam. Para os biólogos, é tudo o que rodeia
e afecta a resposta dos organismos vivos, sejam factores físicos — luz, água,
temperatura, solo — sejam outros organismos que coabitam no mesmo espaço e que
com eles interajam.
A sociedade interpreta o ambiente de
forma egocêntrica, como tudo o que afecta o homem, seja no aspecto físico, luz,
calor, frio, seja no conforto, bem-estar e meio social. Isto torna o ambiente
como uma externalidade, que pode ser rapidamente perceptível e afectiva, se
tiver uma consequência directa na vida do cidadão. Ou ser antes um tema
impessoal, com uma noção de risco longínqua, que não afecta o imediato da vida
de cada um e é ignorado.
De entre os problemas ligados ao
ambiente, há uns com “estatuto” e interesse global, como o caso das alterações
climáticas e a poluição atmosférica e marinha. A terra, a ocupação e uso do
solo, a biodiversidade, não geram preocupação política, embora o seu estatuto
possa vir a ser reconhecido depois do lançamento, em 2018, do relatório final
produzido pelo Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and
Ecosystem Services. Esta plataforma realça a importância de proteger a
biodiversidade, como já tinha sido referido na revisão da Convenção para a
Diversidade Biológica em 2011. Desde 2012, a política europeia chama a atenção
para a necessidade de se tomarem medidas que impeçam a contínua perda de
biodiversidade, especialmente quando está provado que a sua protecção pode
contribuir significativamente para a mitigação e adaptação às alterações
climáticas.
Um estudo recente publicado na Science, em Outubro de 2016, mostra que se não existirem políticas urgentes e
consistentes, a alteração climática vai alterar significativamente e de forma
irreversível a paisagem Mediterrânica. Portugal poderia minimizar a aridez do
território, que já se faz sentir, com incentivos à reflorestação intensiva com
espécies autóctones e de crescimento lento. É tempo de se olhar a “floresta”
portuguesa não só como floresta de produção. Mas para isso são necessárias
estratégias baseadas no conhecimento dos ecossistemas, da biologia e ecologia
das espécies.
Para usar a biodiversidade como
estratégia de mitigação das alterações climáticas há que compreender que não
são só números ou nomes de espécies que se plantam ou introduzem. Um
ecossistema terá de possuir diversidade de características que se complementem,
que interagem, assegurando serviços que regulam e estabilizam o ciclo
hidrológico, a despoluição da atmosfera e o armazenamento de carbono para
compensar as emissões de gases com efeito de estufa. Essas características são
dadas pelos microrganismos do solo, pelas plantas e pelos animais que coabitam
de forma estável e equilibrada. Se um elo da cadeia falta é uma oportunidade
para surgir uma praga, para morrer um animal, para o depauperamento da
vegetação. É esta visão holística que deverá estar subjacente a qualquer medida
ou estratégia política de reflorestação e que tarda em ser assumida.
Os dados que a Sociedade Portuguesa de
Ecologia tem vindo (e vai continuar) a recolher dos sítios LTER (Long Term Ecological Research, www.lterportugal.net) espalhados pelo território nacional e albergando
diferentes habitats e microclimas têm permitido o conhecimento científico sobre
os ecossistemas, tirando partido da relação com a sociedade envolvente. Nesses
locais tem-se estudado, ao longo do tempo, a resposta dos organismos, solo,
plantas e animais. A interdisciplinaridade e a modernidade metodológica da
abordagem permitem a aquisição de conhecimentos sobre a estrutura dos
ecossistemas, a função das espécies, a componente física e humana, incluindo os
sistemas sociais e económicos em que se integram. Os dados adquiridos ao longo
do tempo vão permitir o desenvolvimento de medidas de gestão, baseadas no modo
de interacção entre a natureza, meio físico e biológico, e a sociedade humana.
Ou seja, medidas baseadas nos serviços e produtos que os ecossistemas podem
trazer ao Homem, gerando sustentabilidade e diversificação económica. São estes
conhecimentos que deviam servir de base às futuras políticas de reflorestação,
para melhoria significativa da paisagem Mediterrânica, que tanto atrai o
turismo.
Isto significa educar os jovens, no modo
como olham, tratam e respeitam o ambiente, mas também a sociedade e os
decisores e responsáveis políticos, para saberem usar ferramentas e interpretar
dados que os investigadores produzem. O lançamento, pelo Ministério do
Ambiente, da Estratégia Nacional de Educação Ambiental para o período 2017-2020
merece, pois, ser destacado. Este documento procura enquadrar as políticas ambientais
e o compromisso político que o Governo assumiu com a Agenda 2030 das Nações
Unidas. As actividades vão privilegiar jovens estudantes mas também a formação
a empresários, autarcas, técnicos da administração central e municipal. Esta
formação é fundamental ser implementada tendo presente a descentralização dos
serviços pelos municípios.
Para que queremos o ambiente? Para nosso
conforto e sobrevivência futura. Para isso, a sociedade terá de ser cada vez
mais responsável e apta a defender os interesses de um meio natural que é de
todos e para todos; e o Estado deverá assegurar as condições que permitam a
melhoria da qualidade de vida, individual e colectiva, garantindo os
pressupostos básicos de um desenvolvimento sustentado. No fundo, são os
princípios básicos da Lei de Bases do Ambiente, lançada há 30 anos.
Bióloga, professora catedrática da
Universidade de Lisboa; presidente da Sociedade Portuguesa de Ecologia
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